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Enfrentando a tragédia que é morar na rua

07/04/2009

23/04/09

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Enfrentando a tragédia que é morar na rua

 

Dayan de Castro

Moradores de rua no Anhangabaú

Com o depoimento de um jovem que morou nas ruas, foi dependente químico, conseguiu sair dessa situação, hoje tem emprego, mulher e uma filhinha, e não quer voltar para o inferno do desabrigo, a Viva o Centro inicia uma série de reportagens sobre adultos em situação de rua no Centro de São Paulo, como anunciado no informe Viva o Centro nº 250. A esse depoimento seguem-se entrevistas com autoridades e especialistas no assunto sobre o que se está fazendo e o que ainda precisa ser feito para resolver o problema. 

 

Já foram entrevistados os secretários estaduais de Assistência e Desenvolvimento Social (Seads), Rogério Amato, e de Administração Penitenciária, Lourival Gomes; e os secretários municipais da Saúde, Januário Montone, da Segurança Urbana, Edsom Ortega, e do Trabalho, Marcos Cintra. Para a vice-prefeita e secretária municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads), Alda Marco Antonio, perguntas da Associação foram enviadas em 13/3 e sua Assessoria de Imprensa garante que ela as responderá. O ex-secretário da Smads, hoje vereador Floriano Pesaro, também fala sobre o assunto.

 

Motiva a série a percepção de que a população em situação de rua está aumentando em São Paulo, com maior visibilidade no Centro, onde a grande maioria das pessoas circula a pé. Há controvérsias quanto ao número real de moradores de rua pela dificuldade de contá-los ? entre eles há até pessoas com emprego, mas que, por morar longe e não ter dinheiro para condução diária, se abrigam em albergues, tomando lugar de quem não tem realmente onde morar. As estimativas variam de 13 mil a 19 mil. Assusta, mesmo representando menos de 0,2% dos 10,5 milhões de habitantes da cidade.

 

Exclusão

 

O abandono à própria sorte de populações sem-teto e de mendigos perambulando e dormindo pelas ruas gera mais exclusão e perpetua a marginalização dos já excluídos. No caso específico do Centro, afasta a população dos espaços públicos e usos que a região lhe oferece e dos quais, principalmente os segmentos mais pobres, tanto necessitam. O Centro, que deveria ser o emblema turístico da cidade, gerando emprego e renda para todas as faixas da população, inclusive as mais carentes, é prejudicado.

 

A idéia de que a rua pode ser local de moradia, embutida no conceito de ?povo da rua?, ?moradores de rua? ou ?população em situação de rua?, conduz à aceitação da situação atual de degradação que vai desde a distribuição de comida a céu aberto por entidades ?caridosas? até a transformação das ruas em banheiros.

 

É frustrante perceber como algumas ONGs que trabalham com essa população acabam por beneficiar-se com a permanente exposição de ?corpos? enrodilhados sob as marquises da cidade. Há quem ache até que esse ?espetáculo da miséria? serve para mostrar o quão injusta é a nossa sociedade.  No entanto, o convívio diário com esses ?corpos?, induzindo em amplos segmentos da população a idéia de que isso é ?normal? e de que não devemos nos envolver com ?eles?, resulta na verdade em uma grande tragédia moral. O não reconhecer o outro como semelhante.

 

Alguns desabrigados precisam de muito pouco para elevar-se da condição em que se encontram, como um emprego, por exemplo. Outros requerem mais atenção, como tratamento psiquiátrico e psicológico, internação para desintoxicação de drogas, encorajamento para ingresso em um grupo de apoio para recuperar-se da drogadição, acesso a cursos profissionalizantes, abrigos e albergues funcionando com qualidade, acompanhamento e suporte também à família etc etc. Do jovem ao idoso, o que se depreende da série é a necessidade de um olhar objetivo e pró-ativo para com as pessoas que de fato desejam ser ajudadas e aceitação daquelas que por livre arbítrio não querem sair da rua.

 

A singularidade do caso paulistano é que aqui, à diferença de outras metrópoles, difundiu-se a idéia segundo a qual o disciplinamento do uso do espaço público, limpeza, segurança e intransigência com o vandalismo e os pequenos delitos seriam instrumentos de exclusão e de ?higienização?. O resultado é uma situação na qual todos perdem: a imensa maioria da população da cidade e esse segmento que realmente precisa de atenção e cuidado. Está na hora de enfrentar a tragédia que é morar na rua, sem falsa tolerância.

 

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