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Gestão de Pesaro na Smads e os moradores de rua

21/09/2006

13/05/09

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Gestão de Pesaro na Smads e os moradores de rua

 

Dayan de Castro

Morador de rua no Vale do Anhangabaú

Acompanhe as respostas do vereador e ex-secretário Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads), Floriano Pesaro, às questões formuladas pela Viva o Centro para a série de reportagens ?Enfrentando a tragédia que é morar na rua?.

 

Associação Viva o Centro ? Sua prioridade na condução da questão das pessoas em situação de rua, enquanto titular da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads), foi a criança e o adolescente. O problema no Centro da cidade foi de fato minimizado no que se refere a essa faixa etária. No entanto, o que falta ser feito para não haver mais crianças e adolescentes vagando pela região, uma vez que o número deles ainda gira em torno de 300?

Vereador Floriano Pesaro: Realmente, por determinação do então prefeito Serra, e depois do prefeito Kassab, criança era a prioridade da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social. Em três anos à frente da secretaria (de 2005 a abril de 2008), conseguimos reduzir o número de crianças nas ruas da cidade. Em 2005, havia cerca de 4 mil crianças em situação de trabalho infantil e outras mil morando nas ruas. Ao deixar a pasta, eram 1.842 no total, sendo 802 nas ruas e 1040 no trabalho infantil. Isso pode ser comprovado pelo censo de crianças e adolescentes que fizemos em parceria com a FIPE. Além do aumento do número de vagas na rede socioassistencial, lançamos a campanha ?Dê mais que esmola. Dê futuro?, de mobilização e sensibilização para que as doações que seriam dadas nas ruas fossem canalizadas para o Fundo Municipal da Criança e Adolescente, o Fumcad http://fumcad.prefeitura.sp.gov.br/forms/principal.aspx. É claro que esta política deve ser permanente. As crianças que ficaram nas ruas são os casos mais crônicos, os mais graves. São crianças que perderam totalmente seus vínculos familiares e comunitários e estão seriamente comprometidas pelas drogas. Portanto, o resgate dessas crianças é muito mais complexo, mas não impossível. Apesar de termos avançado de maneira inédita na oferta de atenção especializada para esta parcela ? firmamos parcerias com o Projeto Quixote http://www.projetoquixote.org.br/ e o Programa Equilíbrio http://www.programaequilibrio.org.br/ - ainda falta muito. Nas minhas propostas como vereador, me comprometi a defender a ampliação da rede de atenção em saúde mental para crianças e adolescentes, principalmente onde a escassez de serviços é alarmante.  

 

Na sua opinião, como deveria ser tratada daqui para a frente a questão do adulto em situação de rua?

Acho que a população de rua tem aumentado e provavelmente aumentará ainda mais com os efeitos da crise econômica. A política de atenção voltada para essas pessoas deve evoluir, pois a realidade das ruas mudou muito. A Prefeitura criou um Grupo de Trabalho que propôs ao governo um trabalho intersetorial envolvendo as secretarias de Assistência, Trabalho, Saúde e Habitação. O programa Parceria Social, que prevê apoio para pagamento de aluguel dos albergados ?recuperados?, foi uma proposta deste grupo. Outra proposta, já implementada pela Prefeitura, é a integração da saúde no Boracea, que agora conta com uma AMA (Rua Doutor Ribeiro, 14, Barra Funda, tel. 3392-18540) especializada neste segmento. A população de rua tem demandas estratificadas e não deve ser oferecido apenas um tipo de alternativa. Em Nova York, onde estive por duas vezes como secretário municipal, pude conhecer a realidade dos moradores de rua de lá e os serviços integrados que a prefeitura mantém para esta parcela da população. Lá a questão dos ?direitos e deveres? é bem forte. Para se ter direitos aos serviços do Estado, o usuário deve dar a sua contrapartida, como, por exemplo, levar a sério os tratamentos de saúde e freqüentar grupos de apoio.

 

Boracea

 

Por que experiências como a do Boracea foram marginalizadas na gestão passada pela Prefeitura?

O Boracea não foi nunca marginalizado. Os problemas decorrentes das características da população são, de fato, questões fundamentais para o desenho das políticas de atendimento e provisão de serviços. Portanto, a realidade que encontramos apontou a necessidade de reordenamento e diversificação da rede de serviços. Somado a isso, constatou-se que a convivência simultânea de pessoas com problemas de saúde, alguns deles graves, resultava em uma fonte potencial de atritos, reiterando a demanda de articulação com outras políticas públicas, notadamente, saúde, habitação e programas de geração de renda e emprego, para promover de fato a inclusão social desse público. Outro fator decisivo foi o notório envelhecimento da população de rua. Ao identificarmos essa demanda, adaptamos o serviço do Boracea a este novo perfil. Procuramos a Saúde, que prontamente topou o desafio. Hoje temos lá a AMA Boracea, uma reivindicação histórica da população de rua e que pode ajudar muito estas pessoas alcançarem uma melhor qualidade de vida.

 

Que resultados trouxe o fechamento de albergues no Centro? Segundo algumas entidades, o fechamento seria uma das causas do aumento no número de moradores de rua na região.

Não houve redução de vagas no Centro, mas sim ampliação de vagas em outras regiões. A região sul, por exemplo, passou a contar com um Albergue para mulheres (Reencontro, à Rua Promotor Gabriel Metuzzi Peres, 81, Santo Amaro, tel. 5523-8546); a região leste ganhou mais três serviços em São Miguel, Aricanduva e Sapopemba. A maior quantidade se deve ao aumento do número de pessoas nesta situação que requer um aumento do número de vagas e mais programas que promovam emancipação e autonomia. Diante da tendência ao envelhecimento dos usuários, foi implantado em 2006 o Centro de Acolhida Especial para Idoso (Casa de Simeão, à Rua Assunção, 480, Brás, tel. 3228-2064). Da mesma maneira, a partir do aumento do número de famílias em situação de rua, apontado pelo estudo, foi implantado ainda em 2006 o primeiro Centro de Acolhida para famílias, na região da Mooca.

 

Muitos moradores de rua, hoje, são ex-presidiários. Que tipo de trabalho deveria ser desenvolvido para que em vez de perambular pelas ruas eles fossem reintegrados à sociedade ao fim de suas penas?

A rede deve ter um olhar especial para estas pessoas, não só os que estão na rua. A metodologia que implantamos pressupõe o atendimento humanizado. Foram estabelecidos alguns princípios norteadores do processo de atendimento ao usuário, como ?reconhecimento como sujeito? (a pessoa atendida é estimulada a assumir o papel de sujeito no processo de sua recuperação); o ?respeito à individualidade? (valorizar o potencial criativo e as qualificações de cada um); a ?equidade? (pessoas diferentes requerem diferentes níveis de atenção); o ?caráter processual das intervenções? (a requalificação das relações sociais da pessoa será resultado do encadeamento de diferentes intervenções articuladas entre si); e a ?integralidade da ação? (as intervenções devem considerar aspectos econômicos, sociais, emocionais e da saúde da pessoa).

 

Terceirização

 

Como o Sr. avalia a experiência da Smads de manter entidades, por meio de convênios, para a realização do trabalho social que a Prefeitura vem terceirizando já há alguns anos?

A parceria com o terceiro setor foi o caminho adotado em São Paulo e avalio que elas tiveram, e ainda têm, um papel muito importante na cidade. Elas conhecem bem a realidade destas pessoas, estão próxima delas, são da comunidade e, portanto, têm maior chance de acertar. Mas é preciso avançar para garantir um padrão de atendimento articulado na rede. O Observatório de Políticas Sociais, da Smads, implantou o Observatório local em cada uma das 31 Subprefeituras. É ele quem consolida as informações sobre os serviços de sua área de atuação. Esse fluxo de informações é essencial para que as demais unidades da Smads possam avaliar e monitorar o andamento das ações e rever ou validar as diretrizes do trabalho, subsidiando as políticas públicas. Também desenvolveu, em parceria com a Secretaria da Saúde a Assessoria de Relações Intersetoriais, um instrumento trimestral de avaliação dos serviços socioassistenciais. Trata-se de um índice que, analisado e consolidado, permite verificar a adequação, o cumprimento dos compromissos firmados e a qualidades desses serviços. Paralelamente a isso, adotamos uma política de capacitação continuada para os profissionais da área de assistência social das Subprefeituras e das organizações conveniadas. Um sucesso de capacitação e integração. Um dos nossos parceiros foi o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), que ofereceu treinamento e formação de alta qualidade em formulação e administração de políticas e programas de inclusão social.

 

É possível ao governo fiscalizar o bom emprego da verba pública nesses casos ou as brechas do sistema têm levado a distorções? Em caso positivo, como sanar o problema?

É possível, sim. Sempre encontraremos brechas no sistema e não podemos cair nas armadilhas dos controles rígido que impedem a criatividade e penalizam todos pelo erro de alguns. O que devemos fazer é estabelecer metas e parâmetros claros e pactuá-los. É muito importante ouvir o usuário, fortalecer canais de comunicação, assim acertaremos mais. Também é nosso papel punir os mal prestadores de serviços públicos. Por isso, é importante que a população acompanhe o trabalho de todas as ONGs, a fim de garantir que seus objetivos sejam cumpridos.

 

O problema do morador de rua, no seu entender, é especificamente de que natureza: econômica, social, cultural ou tudo isso junto? E por quê?

Os motivos que levam estas pessoas à situação de rua são variados: desemprego, transtornos mentais, dependência química, expulsão do lar pela família, fuga por motivo de violência, egressos do sistema penitenciário, entre outros. Realizamos um estudo em parceria com a FIPE do perfil da população albergada. O estudo revelou que as pessoas do sexo masculino representam a maior parcela da população usuária desses serviços. Observou-se uma tendência ao envelhecimento, pois a idade média dos usuários está ao redor de 44,7 anos. A proporção de homens com 55 anos ou mais subiu de 13% em 2000, para 23% em 2006. A maioria da população é procedente da região sudeste (49%) seguida dos originários da região Nordeste (41%). Há também um pequeno grupo de estrangeiros, procedentes principalmente de outros países da América Latina (Bolívia, Argentina, Paraguai), que correspondem a 1% dos usuários. Na região sudeste predominam os originários do Estado de São Paulo, que correspondem a 36% do conjunto, sendo que 19% nasceram na capital. Entre os mais jovens, a presença dos paulistas é ainda mais significativa. No grupo que tem menos de 30 anos, quase metade (46%) é procedente do Estado de São Paulo, sendo que 26% nasceram na capital.

 

Desafios

 

A pasta conta com recursos humanos, materiais e orçamentários suficientes para a tarefa que tem em uma cidade como São Paulo? Do que precisaria efetivamente?

De 2004 a 2009, o percentual da pasta da Assistência e Desenvolvimento Social no orçamento do município passou de 1,4% (R$ 181,2 milhões) para 2,2% (R$ 397,5 milhões), ou seja, um crescimento de 219,4%. Mas isto não é suficiente. Meu primeiro Projeto de Lei na Câmara Municipal é justamente para melhorar a Assistência Social: uma emenda à Lei Orgânica do Município determinando a aplicação de 5% do orçamento para a área de promoção e assistência social, uma "reivindicação histórica" da área. Medida similar teve enorme impacto nas áreas de Educação e Saúde. É incluir, de fato, a assistência no bolo de investimentos sociais. O projeto prevê que a aplicação da verba deverá ser gradativa, atingindo o patamar mínimo de 5% em cinco anos. Outra conquista essencial foi a realização em 2008 de um concurso público para a área da assistência social. Isso não ocorria desde 1888. Ou seja, 20 anos sem concurso público para a pasta. Mais de 400 vagas foram abertas pela Prefeitura.

   

O que impede de fato o enfoque intersetorial (Smads, Saúde, Trabalho, Segurança Urbana, Habitação, Educação, Participação e Parceria) para a solução do problema?

A dificuldade do trabalho intersetorial não é um problema só de São Paulo. Todos os governos têm essa dificuldade, pois cada secretaria tem suas prioridades e os recursos são escassos. Mas realizamos um esforço enorme para conseguir melhores resultados sem aumentar os custos, apenas integrando outras áreas como saúde e trabalho.

 

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