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"Quando saí da prisão, ninguém me deu estadia" Depoimento de M.S., 29 anos, morador de rua e usuário de drogas

26/05/2009

26/05/09

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?Quando saí da prisão, ninguém me deu estadia?

Depoimento de M.S., 29 anos, morador de rua e usuário de drogas

 

Dayan de Castro

M.S. e D.G. sofrem com as dificuldades encontradas nas ruas

Motivo

Estou há 6 anos nas ruas e nesse meio tempo fui preso. Infelizmente tive problemas na infância, pois perdi minha mãe quando tinha apenas 11 anos de idade. Em seguida, conheci o cigarro, a maconha, a cocaína e por último o crack.

 

Devido a perda e a distância da família, por ter feito algo que eles não estavam de acordo, eles não me deram apoio, não conversaram comigo, me discriminaram. E me distanciei deles.

 

Prisão

Fui preso porque estava na companhia de outras pessoas que também eram usuárias de drogas e acompanhei essas pessoas em um assalto.Fiquei preso por 5 anos.

 

Quando sai da prisão não tive ninguém para me dar estadia, dar uma força. Foi o fim da minha vida e estou até hoje assim. Não consegui mais acertar a minha vida. Não consigo trabalho, nem família, fiquei dependente da droga.

 

Nas ruas

Durmo na Sé ou no Largo São Francisco. Algumas entidades sempre deixam alguma coisa para a gente comer. Já procurei um Cras ? Centro de Referência de Assistência Social Sé - na Avenida Tiradentes, mas me falaram que não me encaixo no perfil deles.

 

Antes tinha mais albergues, dava para acolher mais pessoas. Hoje em dia fecharam vários, e na maioria dos que estou indo, falam que não tem vaga, que tem que aguardar. Sempre explico que não posso ficar nas ruas, pois tenho pendência com a justiça. Eles falam que tem que aguardar, pois não tem vaga e as vagas que têm é para senhores de idade e pessoas com alguma doença.

 

Já tentei arrumar emprego, mas me pedem antecedentes criminais e não tem como, o atestado acusa. Arrumei bico, trabalhei como camelô, vendi refrigerantes, cuidei de carros para sobreviver.

 

Vício

De vez em quando cuido de uns carros e arrumo um dinheiro para sustentar meu vício.

Já tentei procurar tratamento em uma clínica de recuperação, achei que eles iam me dar um incentivo, que iria ter atividades, uma escola, um serviço voluntário para poder fazer alguma coisas, mas não.

 

Não tinha nada para fazer. Tinha monitores arrogantes. Não conseguia entender, pois tinha gente que freqüentou a clínica quatro vezes, ficou nove meses, saiu da clínica sem usar nada e nas ruas voltou a usar de novo e teve que voltar para a clínica.

 

Não tinha uma escola para acompanhar, nem alguma coisa para trabalhar a mente. Achei melhor me afastar, pois ia perder meu tempo, não vou ter futuro nenhum. A única coisa que você vai ter é uma cama, um café da manhã, almoço e janta. Mas não tem uma cultura. Só vi mesmo um monitor dando as ordens e a gente tinha que acatar, ele não aceitava nossas opiniões.

 

Não entrei lá para arrumar encrenca, da mesma forma que entrei eles me deram a oportunidade de sair. Mas tem resultado, conheço pessoas que ficaram na clínica e conseguiram arrumar emprego, estão com a família, sossegados, e há mais de 23 anos sem usar nada.

 

Guarda Civil Metropolitana

A GCM chega com caminhão e carrega colchão, cobertor, bolsa e o que tiver pela frente e jogam no caminhão. Não tem quem chegue perto, se chegar, leva borrachada. Você pode ir na Praça da Sé, no Anhangabaú, onde tiver morador de rua eles fazem isso.

 

Uma possível solução

A solução para sair das ruas é arrumar um trabalho, uma oportunidade de emprego para poder correr atrás de alguma estrutura para minha vida, pois no momento eu não tenho estrutura nenhuma, nenhum alicerce. Queria um trabalho, pois acho que por meio desse trabalho eu conseguiria dar os passos que estão faltando.

 

?Procuro emprego todos os dias. Quando falo que moro em albergue...? Depoimento D. G., 23 anos, morador do albergue Pedroso

 

De Minas a São Paulo

Vim de Minas Gerais para trabalhar. Arrumei emprego e morei no alojamento da empresa. Mas a empresa declarou falência e fiquei sem emprego. Tem 6 meses que estou desempregado. A empresa que trabalhava me mandou embora sem seguro, e estou esperando para ver se dá alguma coisa, ainda está com advogado.Fui assaltado e roubaram todos os meus documentos. Acabei nas ruas.

 

Não penso em voltar para Minas, pois aqui tem muito lugar para emprego. O problema é o lugar para morar, pois quem mora em albergue é discriminado. Não adianta chegar na empresa e falar que mora em albergue. Eles falam que albergado vai querer trabalho para quê? Acham que gente que mora em albergue é drogado, bêbado ou então rouba.

 

Eu já escrevi duas cartas para o programa do Gugu para ver se encontro minha mãe, vou ver se  arranjo um bico para enviar as cartas. Depois que nasci nunca mais vi minha mãe. Fui criado pelo mundo, pelas fazendas.

 

Dormindo no albergues Pedroso

Vivo no albergue Pedroso, é melhor do que a rua. Lá tem apenas um chuveiro quente, os outros são frios. O banheiro é uma imundície, o espaço fede tinta e é abafado, e os monitores desrespeitam. O refeitório é um lixo, você come, Deus que me perdoe, mas com pessoas babando, um monte de gente suja, se coçando.

 

Tem gente que dorme sem coberta. Não tem forro de cama, nem sabonete para todo mundo tomar banho. E tem que fazer fila para tomar banho. As pessoas chegam lá para tomar banho, e os monitores dão uma toalha de rosto para enxugar. O banheiro tem só três vasos sanitários

 

300 pessoas vivem nesse albergue. Todos têm direito a cama, mas os armários são todos misturados, mulher com homem. As roupas boas que os albergues recebem são levadas para bazar ou algumas os monitores pegam para eles. Qualquer um pode ir lá e ver isso.

 

O cara anda sujo, mendigando, como vai andar mais limpo se não tem lugar para todo mundo?

 

Emprego

Vou à noite para o albergue e saio às 6h da amanhã para procurar emprego.

Procuro emprego todos os dias. Sou tratorista. Trabalhava no corte de cana. Como aqui não tem isso, então estou procurando emprego de ajudante de pedreiro, que tenho registro na carteira. Já fui a várias empresas, mas quando falo que moro em albergue...

 

Preciso de uma oportunidade, uma casa para morar, aí posso conseguir tudo. Em albergue não dá para arrumar nada, a gente é discriminado.

 

Guarda Civil Metropolitana

Na rua você passa por coisas que nem os cachorros passam. A GCM acorda os moradores de rua xingando, batendo em alguns caras, levam tudo. A Prefeitura não faz nada, e se faz é mandar lavar a calçada e bater nos outros, só querem prejudicar. A GCM já me pegou pela corrente que eu usava no pescoço e me deu dois socos no estômago. Quase morri. Me mandaram voltar para minha terra.

 

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