Home > Notícias do Centro > Notícias > SOCIEDADES AMIGOS DE BAIRROS SABs: escolas de cidadania e jardins da democracia.

SOCIEDADES AMIGOS DE BAIRROS SABs: escolas de cidadania e jardins da democracia

20/12/2024

Sosiedade Amigos Da Cidade
 
SOCIEDADES AMIGOS DE BAIRROS SABs: escolas de cidadania e jardins da democracia.

25 de janeiro de 1934 - 25 de janeiro de 2024: 90 anos de História

Por Edison Farah

SOCIEDADES AMIGOS DE BAIRROS
SABs: escolas de cidadania e jardins da democracia.

1- Surgimento e evolução dos SABs em São Paulo

2- O período autoritário e as SABs

3- As SABs na atualidade

4- O Meio Ambiente e as SABs

1. SURGIMENTO E EVOLUÇÃO DAS SABS EM SÃO PAULO

A década de 50 foi o cenário do rápido processo de industrialização de São Paulo e seus municípios vizinhos, por meio da introdução da indústria automobilística e da expansão das indústrias têxteis, de eletrodomésticos, siderúrgicas, construção civil, dentre outras. Tal processo levou a um crescimento explosivo e desordenado da cidade e de sua população, tendo este aumento experimental expressivo através da chegada de imigrantes atraídos pelas possibilidades de emprego na cidade que só faziam crescer.

O impacto desse rápido crescimento tornou-se ainda mais exposto a deficiência e a incapacidade da administração pública em atender a demanda por educação, saúde, urbanismo, saneamento, e todas as condições básicas para um mínimo necessário de oferecimento de boa qualidade de vida à população.

Após a revolução de 32 os paulistas ficaram deprimidos. Todavia não perdeu sua essência como povo líder, combativo, empreendedor, como é esperado gravado em nossa bandeira o lema de São Paulo: "Non ducor, duco!", ou seja, "Não sou demora, conduzo!".

Entre outras diversas ações para retomada da liderança política, empresarial e social no Brasil, nomes de destaque da sociedade paulistana, como Francisco Prestes Maia, Ibrahim Nobre, Lucas Nogueira Garcez, Laudo Natel, Otho Cirilo Lehman, Anhaia Mello, Goffredo S. Telles, Lauro de Barros Siciliano e outros, fundaram em 25 de janeiro de 1934 a Sociedade Amigos da Cidade.

Nas palavras do atual presidente da SAC, o advogado e mestre João Baptista de Oliveira, "esta iniciativa surgiu em um momento para a cidade. Naquela época São Paulo estava lambendo as feridas, porque havíamos perdido a Revolução de 32. São Paulo difícil de usar de Alguma coisa que aumentasse sua autoestima. Foi quando foi criada a Sociedade Amigos da Cidade, com o objetivo de preservar os valores, a tradição, os símbolos da cidade".

E assim na década de 40 foram surgindo os primeiros SABs, durante o período de mobilizações populares, as quais adquiriram papel relevante no contexto da década de 50, transformando-se, paulatinamente, em importantes canais de ligação entre as declarações dos moradores e os poderes públicos, atuando como instrumentos de pressão para a concessão de serviços e obras básicas e, sobretudo, dando início a um processo educativo dos princípios de cidadania e de comunidade. A par dessas tarefas, as SABs atuaram como instrumentos de resgate dos valores culturais dissipados pela migração, e no aprofundamento das noções de ambiente e de solidariedade.

Por tais características que aliavam a ação reivindicatória ao fortalecimento dos vínculos comunitários, essas associações conquistaram papel de importância na vida da cidade e no processo de organização popular, permitindo a pressão do cidadão e da comunidade sobre o Poder Público e partidos políticos, na defesa de seus direitos.

Contudo, neste tópico da história do SAC, temos que consignar especial homenagem ao Engenheiro Mário Savelli, seu presidente na década de 70, pela sua atuação relevante, e intenso e primoroso trabalho para a formação de lideranças comprometidas com a comunidade, despertando na juventude o sentimento de pertencimento, essencial para o exercício da cidadania, e promovendo a criação de ofertas de SABs em diversos bairros de São Paulo.

2. O PERÍODO AUTORITÁRIO E AS SABS

A instalação do regime militar em 1964 interrompeu significativamente os movimentos de organização popular e, por consequência, o desenvolvimento das SABs. Instaurando-se uma repressão sobre qualquer esforço de organização, já que os SABs sofreram um profundo processo de esvaziamento, processo esse agravado pela massificação via meios de comunicação, que levam o indivíduo ao isolamento e à passividade, sobretudo antes da total falta de alternativas de participação que então se impunha.

Mas, paralelamente ao processo de esvaziamento dessas entidades, o regime dedicava-se a instrumentalizar os remanescentes e a criar novos SABs que fossem dados aos seus interesses. É neste processo que tais entidades adotam uma prática clientelista, desvirtuando suas verdadeiras funções. Se não todos, certo a maior parte dessas associações se transformaram ou em meros centros de lazer, ou em currais eleitorais de políticos, ou então em entidades meramente assistencialistas, controladas por "líderes" apaniguados pelo regime vigente, que norteavam sua atuação pela busca do controle do movimento popular e pela "troca de favores" com políticos.

Por essa época ocorre também a centralização do poder económico que retira das Câmaras Municipais a faculdade de decisão sobre aplicação de recursos. E é justamente nestes segmentos que concentrava-se o poder de pressão dos SABs, fato que dificultava ainda mais sua atuação dentro dos princípios verdadeiros que deveriam orientar essas associações.

Essa, portanto, é a tônica da situação dos SABs nesse período: esvaziadas, destituídas de representatividade, cerceadas em sua área de atuação, instrumentalizadas por interesses políticos, elas vão, aos poucos, apagando-se na memória da coletividade ou transformando-se em objeto da desconfiança do cidadão.

3. AS SABS NA ATUALIDADE

O período de redemocratização iniciado em meados dos anos 70 encontra os SABs nas condições acima descritas. Esse movimento de organização comunitária vive a crise e seus reflexos na sua própria sobrevivência, impondo-se um movimento de interiorização, autocrítica e redirecionamento de objetivos, na busca de novas formas de reerguimento e atuação.

No presente momento temos uma cidade agigantada, caótica, superpopulosa, São Paulo transformada em um verdadeiro acampamento. São Paulo não é mais uma Urbe. Transformou-se num acampamento. Num acampamento de desesperados!

Coloca-se a questão: O que fazer perante tal conjuntura?

A história prova que somente através da participação de todos os segmentos da população é possível encontrar soluções. A complexidade da vida moderna deve impedir a pretensão de se conduzir a administração da coisa pública de maneira centralizada, pois tal pretensão reflete incompetência ou má-fé.

À medida em que as cidades crescem (e, no caso de São Paulo, agiganta-se), cabe às SABs, mais do que nunca, o papel fundamental de servirem de elo entre as aspirações da comunidade e os poderes públicos, direcionando esforços coletivos para a preservação, conservação e manutenção de equipamentos urbanos, o que, no Hemisfério Norte, chama-se "iniciativa dos cidadãos".

O potencial dos SABs é enorme. Podem ser o germe da verdadeira democracia participativa, desde que se libertem das injunções político-partidárias e se transformem de fato em polos de convergência dos anseios e das reivindicações da população local e, principalmente, em polos de congraçamento, onde cada cidadão expõe em seu vizinho um irmão.

Sem dúvida, para alcançar tais objetivos pressupõe que essas entidades de moradores se organizem de fato, deixem de ser grupos simples que se formam aleatoriamente, e passem a contar com um mínimo de infraestrutura que garanta:

1- a participação efetiva da população local;

2- representatividade legítima para suas lideranças;

3- transporte de recursos materiais e humanos necessários para uma boa operacionalidade das atividades a que se propõe;

4- mecanismos de autodepuração que impeçam definitivamente a sua manipulação por interesses estranhos.

Atualmente o universo dos SABs em São Paulo é pontilhado por entidades que buscam realmente cumprir os objetivos de uma associação externa unicamente aos interesses da população local e, infelizmente, é pontilhado também por entidades sem representatividade local, capitaneadas por interesses estranhos à comunidade, que atuam ora como instrumentos de projeção de seus "líderes", ora como balcões de "troca de favores" com políticos, contaminadas pelo clientelismo e pelo assistencialismo.

A propósito, sobre "líderes" comunitários, vale aqui um oportuno esclarecimento: a partir da democratização de algumas instâncias de decisão no Brasil, a nível municipal ou estadual e mesmo, federal, na esteira de alguns governos mais ou menos de cultura participativa, como soe aconteceu neste país, surgiu logo uma nova modalidade de aproveitamentos, pessoas que desenvolveram na atividade comunitária um meio de vida, uma forma de tirar benefícios pessoais e/ou financeiros, indivíduos a quem pensam chamar de "pelegos da cidadania", "líderes comunitários de prateleira", à disposição e para servir aqueles que lhes pagam. Esta nova figura após temas e/ou causas populares quer de ordem socioeconômica, seja ambiental, ou urbana, e até religiosas, para, na primeira oportunidade, à melhor oferta, venderem seus préstimos, treinando vergonhosamente quem neles confiou.

Por outro lado, é de capital importância ainda combater o isolamento existente entre os SABs, buscando mecanismos de atuação conjunta, criação de entidades que os congreguem sem ferir os princípios de independência e os especialistas de cada associação, mas sim, buscando, através da união , o fortalecimento do movimento. É ainda preciso garantir aos SABs o poder de decisão sobre as prioridades locais. Ou seja, deve ser definido um nível institucional uma legislação que assegure à população o poder de deliberar sobre todos os projetos e equipamentos urbanos pertinentes à sua jurisdição.

4. O MEIO AMBIENTE E AS SABs

Há décadas defendemos a tese de que a aspiração máxima de toda sociedade deve ser a felicidade do Homem. É parte essencial dessa felicidade um "Habitat" que garanta ao ser humano condições mínimas de saúde física e psicossocial. Sem um "habitat" adequado ao homem já é, antes de mais nada, um ser doente, e o Meio Ambiente é fator absolutamente condicionante da saúde.

Referimo-nos ao Meio Ambiente em toda a sua complexidade e abrangência, que vai além da exigência primordial de preservação da natureza, do verde, dos ecossistemas, e que engloba aspectos como a otimização dos equipamentos urbanos, a conservação de calçadas, parques e praças, a implementação de um sistema de transportes racional e adequado às necessidades da população, e que agrida o menos possível o entorno natural, com a implantação de uma legislação urbana que cerceie a especulação imobiliária e sua ação deletéria sobre as cidades, preservando conjuntos de valor histórico, atualizado ou cultural, enfim, que respeita cada aspecto do cotidiano da comunidade.

Como os SABs precisam popularizar urgentemente entre a comunidade a noção de que a cidade e o bairro são seus, que ela pode e deve participar do gerenciamento e preservação da preservação de seu "habitat", mas que, somente organizado, poderá exercer tal papel em proveito próprio das futuras gerações.

A comunidade deve ser informada que a preservação do Meio Ambiente reflete-se também nas questões pertinentes à segurança do cidadão. Uma cidade com parques, praças, ruas, pontes, abandonadas e destruídas transforma tais locais em cenários de banditismo e de violência. A precariedade de áreas de lazer e de atividades culturais patrocinadas pelo município subtraem à juventude a possibilidade de experiências enriquecedoras, facilitando seu ingresso no mundo das drogas e da violência. Afinal se a praça, a rua, não estão ocupadas pela comunidade e suas crianças, são dominadas por marginais e pelo crime organizado que, palmo a palmo, ocupam os espaços dos quais a comunidade abriu mão, e onde o cidadão vive no cotidiano como um refém, atrás das notas com que ele mesmo se cerca, para ter uma ilusória sensação de segurança.

Portanto, como corolário dessa saga, nada melhor que os SABs, que são os cidadãos organizados na defesa do seu espaço, para exercerem as funções de prevenção da destruição ambiental. Cada cidadão deve ser um fiscal do Meio Ambiente, deve ter plena consciência de que ele faz parte do Meio e, portanto, considerar que qualquer agressão a esse Meio é um perigo à sua integridade.

A falta de um projeto de nação, de um ideal coletivo, de objetivos altruístas e/ou comunitários, leva as criaturas à patologia do individualismo, e à desesperança, a qual é fruto da consciência da sua impotência, da sua nulidade numa polis hostil.

 
SABs: Escolas de Cidadania e Jardins da Democracia
 

Edison Farah, brasileiro, paulista, paulistano, economista, formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é tributarista, e jornalista. É Consultor em administração, tributação, e projetos sociais para empresas e organizações da sociedade civil. É Presidente do Bairro Vivo-Instituto de Desenvolvimento Urbano e Social. É Presidente da Associação "Viva o Centro" de São Paulo. É Vice-presidente da API-Associação Paulista da Imprensa. É membro da coordenação do Fórum Permanente da Cidadania, Meio Ambiente e Segurança Pública de São Paulo. É membro do movimento "Defenda São Paulo".

 

Deixe Seu Comentário:

Gostou? Então compartilhe.